noticias Publicado em 27 de setembro de 2011
Mais uma da Amélia Bündchen
Menos de uma semana depois de o Brasil enviar a primeira mulher para abrir uma Assembleia Geral das Nações Unidas, a marca de lingeries Hope reforçou um outro tipo de imagem da mulher brasileira em sua nova campanha publicitária. Quem protagoniza a peça é a modelo Gisele Bündchen, que exibe o corpo impecável com as roupas da empresa.
“Você é brasileira. Use seu charme” é a mensagem-chave da publicidade. No comercial, a top ensina o modo “certo” de assumir pequenos deslizes para seu marido e traduz, em poucos minutos, os estereótipos que há anos grupos feministas tentam derrubar.
Gisele tem a difícil missão de contar ao cônjuge alguns de seus pecados, como estourar o limite do cartão de crédito e bater o carro do maridão. Para se safar da fúria do homem, ela precisa usar seus dotes “genuinamente brasileiros”. O que consiste em exibir o corpo escultural de lingerie e dizer, com um leve gingado, as atrocidades cometidas contra o provedor da casa.
Não bastasse o estereótipo da mulher que, sem trabalho, acaba por descontrolar-se nas compras e gastar todo o dinheiro do casal – com o retoque do mito ‘Mulher no volante, perigo constante’ – a propaganda ainda reforça o ideário destinado à brasileira, a da sedutora inverterada.
Ao mesmo tempo em que consagra o modelo da mulher-objeto, a propaganda desqualifica aquela que não carrega o modo sedutor de ser. Uma conversa sem performances de sedução – e com roupas – é tida como “errada”.
Não é um caso isolado. A estereotipação de mulheres na indústria da propaganda é corriqueira e altamente discriminatória. No mundo dos publicitários, aparentemente, o sexo feminino é aquele destinado às tarefas domésticas (em comerciais de produto de limpeza) ou à satisfação masculina nas propagandas de cerveja, em que o produto é associado com o companheirismo entre amigos, fim de expediente e atrizes exuberantes.
Ao apelar para a identificação entre a espectadora e a modelo, o comercial constrange a brasileira que busca se libertar justamente da imposição do tal “charme brasileiro”.
Existe um outro movimento ao retratar o universo feminino dentro da publicidade, conectado à realidade da mulher contemporânea, na inserção no mercado de trabalho e no compartilhamento da renda do lar. Ainda muito discretamente, no entanto, a publicidade sequer se aproxima de dar conta do complexo cenário em que se enquadra o feminino no Brasil.
Por enquanto, a propaganda ainda se encontra a anos-luz das conquistas do movimento feminista, da emancipação feminina e da construção de um ideário de igualdade entre os sexos.
Por Clara Roman, Carta Capital